segunda-feira, 19 de maio de 2008

18. Entre o que é tortuoso e a torta


Às três da tarde, depois de almoçar um sanduíche na lanchonete do bosque, foi encontrar Maria Luísa e Jardel na sorveteria. Ao vê-lo abatido, quiseram saber o que havia acontecido. Sabendo da situação, os dois ofereceram suas casas até que se resolvesse o incidente.

Tudo era muito delicado, ele entendia a preocupação da amiga e daquele rapaz que tinha sido a grande alegria de seus últimos dias, mas sentia vergonha do que lhe tinha acontecido, estava com raiva da mãe e não queria envolver ninguém na história. Sugeriram então que ficasse num hotel da cidade por um ou dois dias. Ele concordou com a idéia.

Em um momento de descontração, Jardel gracejou dizendo que a coisa podia não ser tão ruim quanto se pintava.

- Há males que vêm para o bem. Será que vamos ter um lugar para a gente se encontrar.

Maria Luísa então quis saber da novidade, que já deduzira pelo telefonema na noite anterior. Conhecia Jardel há pouco e não lhe passou pela cabeça que era gay.


- Para falar a verdade, disse ela, você estava na minha lista.

- Amiga! Vai ter que ficar pra outra encarnação. Caçoou Jardel

Ela contou por que não fora à reunião em que os dois puderam se encontrar. Acaso das circunstâncias ou predestinação? O pai não estava bem e ela preferiu ficar em casa. Otávio aproveitou para alertar que não podiam dar vez ao azar. Era preciso que ela soubesse que estava envolvida na história com os pais de Jardel e era necessário que ela e Jardel combinassem também com Adriana, já que Otávio não a conhecia.


- Não acho uma boa idéia. A Adriana iria querer saber o motivo e não sei se seria interessante contar a ela. Avisou Maria Luísa.

- E se um dia ela se encontrar com o tenente e Dona Elizabeth ou ligar pra casa deles e o assunto vier à tona? Insistiu Otávio.

- Isso tem pouca possibilidade de acontecer. Concluiu Jardel.

- Estou tentando evitar situações constrangedoras. Continuou Otávio.

- Relaxa. Aconselhou Maria Luisa. Você está muito tenso. Quer controlar tudo. Dê uma chance para o inesperado. Veja que coisa boa aconteceu para vocês!


Riram e as horas se passaram como um alento para Otávio, mas ele teria que voltar para casa para pegar algumas roupas.


Quando se despediram, Jardel pediu que quando já estivesse instalado no hotel, que ligasse para se encontrarem. Poderiam passar mais algumas horas juntos para que Otávio não sentisse tão mal. Ele sorriu com o ato de carinho. Já não era mais alguém completamente só.

Ao chegar em casa, foi direto ao quarto e encontrou-o completamente arrumado. Na cozinha, a mesa estava posta e a mãe, sentada à cabeceira, silenciosa, esperava-o para o lanche da tarde com a torta de maçã que era a sua preferida.

6 comentários:

descolonizado disse...

mães são sempre tão maravilhosas!

¿Controversy! disse...

Mãe é sempre assim mesmo. Nos estressa com a irritabilidade feminina e nos acaricia com a ternura materna ao mesmo tempo. A questão é saber dosar isso, o que nem sempre é fácil.
¿Até!

Anônimo disse...

"Já não era mais alguém completamente só."

Ah, a solidão humana... Tenho uma teoria (e talvez a desenvolva no blog) de que nós gays vivemos uma relação ambígua com ela. Ao mesmo tempo em que a expulsamos, fazemos a ela um convite periódico em cada piscadela de olho que damos prum cara diferente na rua.

Mudando de assunto, mandei-lhe um email e não obtive resposta. Seu silêncio é algo com o qual devo me acostumar? Risos.

Thiago de Assumpção disse...

nossa lindo..
vc realmente escreve textos lindos

Alberto Pereira Jr. disse...

"- Amiga! Vai ter que ficar pra outra encarnação. Caçoou Jardel"

adorei.. hehehehe


realmente as mães batem, mas se corroem de remorso e buscam o perdão

Leo Carioca disse...

Isso parece aquele típico comportamento materno mesmo: a mãe briga, briga, fala, fala, depois se desarma.
Nem sempre é assim, é claro.